Quando se discute a posição do Estado em relação às comunidades religiosas, costuma-se invocar o principio da laicidade como principio definitivo do Estado de Direito.
Fala-se assim em Estado Laico, como o Estado que não avalia os seus cidadãos nem os discrimina em função da sua religião. Este principio, no entanto, pode funcionar em várias vertentes e para várias culturas do Direito e da Liberdade.
Estado Laico, no entanto, não é o mesmo que Estado "Laicista", ou de ideologia "laicizante" dos cidadãos. Viola-se a neutralidade do Estado para com as escolhas religiosas dos seus cidadãos quando se proíbe ou se impõe entraves ao culto ou estudo ou profissão de uma religião. O Estado Português produto da Revolução Republicana de 5 de Outubro e da Constituição de 1911, devido à carga ideológica radical dos partidos dominantes e da própria Constituição, era altamente anti-clerical e anti-religioso, violando princípios básicos e liberdades consideradas garantidas e seguras que já vinham de tempos até anteriores às primeiras Constituições Monárquicas. Neste caso não podemos considerar que estivemos na presença de um Estado Laico, visto que estávamos perante uma atitude frente à religião que pode até ser considerada dogmática, o
ateísmo militante
. Contrariando assim o verdadeiro objectivo do ateísmo, partilhar livremente uma vida sem religião e Deus e mesmo assim valiosa e repleta de significado intrínseco, os republicanos do 5 de Outubro, que ainda andam por aí, criaram outra religião,
a religião da opressiva ausência de Deus
, o
Ateísmo Divino
.
Como remate deste texto, fica uma pergunta teórica para os leitores: Será que a presença de uma religião oficial inibe a formação de um Estado Laico?
Podemos assim considerar que o Estado Português, durante o período de vigência da Constituição de 1826, era um Estado sem liberdade religiosa e cuja cidadania era defendida pelo Estado de acordo com a sua religião? A resposta, obviamente, é não.
O Reino da Jordânia, que considera na sua Constituição o carácter oficial do Islão enquanto religião oficial do Estado, é uma terrível ditadura "
ayahtolla"
intolerante? A óbvia resposta é não. É talvez a nação de cultura islâmica mais tolerante, tendo muitos menos problemas com as diferentes comunidades religiosas que a Turquia "laica".
A oficialidade de uma religião prende-se ao perfil cultural de um povo, de uma nação, de uma história. Isto deve-se ao simples facto de a Religião, para todos os efeitos, ser ela própria um dado cultural, inserido dentro dessa enorme miscelânea que costumam ser as civilizações.
Podemos assim esquecer a típica definição de Estado Laico como estado não-oficial. As hipóteses de um cidadão ser reprimido pelas suas escolhas religiosas num Estado Laico de inspiração Ocidental são tantas como num Estado Islâmico, o que muda é o contexto histórico em que se está inserido. No tempo em que as repúblicas jacobinas francesas e portuguesas privavam os homens livres do seu culto original, essas mesmas nações e povos islâmicos, entre eles a Turquia, davam boas provas de civilidade à Europa.
A Liberdade Religiosa e o Estado Laico medem-se assim, só e puramente, pelo grau de intervenção do Estado nas Igrejas e Cultos e o grau de afectação que toma em relação a estes.